Marco Civil da Internet em xeque: Responsabilização das Big Techs é contrária à Liberdade de Expressão?
- Piva Advogados
- 5 de fev.
- 3 min de leitura
Atualizado: 19 de fev.

A recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que responsabilizou o WhatsApp por inércia diante de um caso de "pornografia de vingança" nos traz a oportunidade de refletir sobre o debate que tem sido travado de responsabilização das plataformas digitais pelo conteúdo publicado por seus usuários.
A discussão envolve não apenas questões de direito civil e penal, mas também aspectos fundamentais da liberdade de expressão e da regulação da internet no Brasil.
O Marco Civil da Internet e a Regra da Responsabilização
O artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014) estabelece que os provedores de serviços de internet só podem ser responsabilizados civilmente por conteúdo gerado por terceiros se houver uma ordem judicial prévia determinando a remoção e a plataforma não cumprir a decisão. Essa norma tem como objetivo garantir um equilíbrio entre a proteção dos direitos individuais e a liberdade de expressão na internet. Contudo, em casos de crimes, como é o caso analisado de pornografia de vingança, discursos de ódio e desinformação, a discussão sobre a eficiência desse modelo se intensifica.
No caso do WhatsApp, a empresa argumentou que a criptografia de ponta a ponta impede a remoção de conteúdo, pois as mensagens não são armazenadas em seus servidores. O STJ, no entanto, considerou que a empresa foi inerte e poderia ter adotado medidas para mitigar os danos à vítima. Essa decisão abre margem para um novo entendimento sobre a responsabilidade de provedores digitais, especialmente em situações que envolvem direitos fundamentais.
O Debate no STF e a Liberdade de Expressão
Atualmente, o Supremo Tribunal Federal (STF) está discutindo questões que refletirão muito o nosso futuro e o futuro do contencioso, sobre a responsabilização de redes sociais e serviços de mensagens em relação às postagens de usuários. Esse debate inclui a atuação de empresas de tecnologia, como Meta (controladora do Facebook, Instagram e WhatsApp) e Google, e também de emissoras de TV e aplicativos de conteúdo.
Alguns exemplos de debates sobre a responsabilização das redes sociais incluem:
O caso Choquei, que envolveu a morte de uma estudante mineira após relatar ter sido vítima de ataques nas redes sociais;
O embate entre Elon Musk e Alexandre de Moraes, ministro do STF, sobre a moderação de conteúdos no X (antigo Twitter);
O Projeto de Lei 2630/2020, conhecido como PL das Fake News, que propõe regras mais rígidas para a responsabilização das plataformas digitais.
O STF e outros tribunais tomarão decisões ao longo deste ano que terão impacto direto na forma como o Brasil se posiciona em relação à liberdade de expressão e a proteção dos direitos individuais, de forma mais ou menos paternal. Um dos principais desafios é determinar até que ponto uma plataforma pode ser responsabilizada sem comprometer o princípio de neutralidade da rede e o livre fluxo de informação.
Tendências e Possíveis Mudanças na Regulação
A crescente pressão sobre as plataformas digitais para monitorarem e removerem conteúdo ilegal pode levar a mudanças na legislação ou à reinterpretação do Marco Civil da Internet. Se o STF ou o legislativo flexibilizarem a necessidade de ordem judicial prévia para a remoção de conteúdo prejudicial, as empresas de tecnologia poderão ser obrigadas a agir com maior celeridade para evitar penalizações. Isso significaria que as plataformas precisariam estabelecer mecanismos mais rígidos de monitoramento e remoção de conteúdo, o que poderia resultar em um controle mais ativo sobre as publicações dos usuários, potencialmente afetando a liberdade de expressão.
Além disso, a flexibilização da exigência de ordem judicial prévia para remoção do conteúdo poderia gerar desafios adicionais, como um aumento na autocensura por parte das plataformas, que passariam a remover preventivamente conteúdos para evitar riscos jurídicos. Isso poderia criar um cenário no qual as big techs teriam um papel ainda mais determinante na definição do que pode ou não ser dito na internet, deslocando o centro de decisão do Judiciário para o setor privado, mas, por outro lado, podendo acelerar o tempo de resposta para adoção da medida.
Neste sentido, uma regulamentação mais forte pode trazer maior proteção para vítimas de crimes digitais, reduzindo o tempo de resposta para a remoção de conteúdos que violem direitos fundamentais.
Em resumo, o futuro da regulação da internet no Brasil vai depender do equilíbrio entre a necessária proteção dos direitos das vítimas, tendo em vista o crescente aumento de casos que são levados ao judiciário neste sentido, e a preservação da liberdade de expressão. O caso do WhatsApp é apenas um dos muitos exemplos de como essa discussão está longe de um consenso definitivo e continuará a ser analisada pelos tribunais ao longo dos próximos anos.
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